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domingo, 19 de outubro de 2008

Solidão

Descobri o que tanto me angustia e aos poucos me mata, é o fato da realidade sobrepor-se a minha fantasia de estar com alguém. A verdade é que eu, como qualquer ser humano, sou só e estou só.

Apenas um detalhe me difere da maioria humana; consciência. Eu sei que sou só, e me entristeço. Não que minha tristeza me traga piedade, ou faz-me melhorar, no entanto, ao mesmo tempo em que angustia, conforta-me com sua segurança, porque quando temos a felicidade, tememos perdê-la; já, quando temos apenas a nós e nossa tristeza, nada tememos porque já havíamos perdido tudo.

“Chega de saudade”, cantou João Gilberto, entretanto, saudade de quem se somos sós? Da ilusão. O ser humano é iludido na crença da solidão inexistente, ou seja, ele crê estar vinculado uns aos outros. É por isso que todos temem a morte. A morte é o choque da realidade, a morte é solitária. Não é triste apenas para quem já conhecia a solidão, mas para aqueles que a negavam, sim. Estes temem a morte porque só se morre sozinho.

Certa vez um cachorro foi atropelado na frente de casa. Fiquei olhando-o agonizar. O cão esganiçava, contorcia-se, queria se levantar e ir para algum lugar seguro. Da boca o sangue fluía para o asfalto. Não demorou muito que outro carro o matasse. Estava no meio da estrada, já era de madrugada. O motorista descuidado passou por cima de sua cabeça, quebrou o pescoço. E assim foi-se um cão.

Talvez o cão tivesse consciência de que era seu fim, talvez imaginasse um céu cheio de carteiros para perseguir. Talvez, não. Só sei que o cão morreu sozinho. Como qualquer um em seu lugar. Descobri às duras penas que não se pode trocar de lugar com quem está morrendo, nem sequer podemos fazer companhia. Enfim, solidão é só o começo da vida, porque só se percebe que está vivendo quando descobre que não se pode viver por outrem.

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