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terça-feira, 26 de maio de 2009

Carta de despedida

Queridos amigos e amigas. Já não sou mais eu quando do relato desta carta. Sei que muitos de vocês estão cansados com seus próprios problemas. Eu também estou com os meus. Amigos, resolvi derrotá-los de uma vez, derrotar minha parca vida de uma vez por todas. Dizer adeus a esta personalidade é o menor dos males do meu jazigo, talvez nem male seja deixar de ser.

Renascer em outro ser, outro corpo e deixar meu passado no passado. Matar minha antiga existência e descobrir uma nova face do mundo, da essência. Olhei pela janela pela última vez, décimo andar desse edifício de 30 andares comerciais. Nunca mais terei essa vista, mas esse fato não dói. É um consolo saber que de hoje em diante o céu será minha morada, em vez de simplesmente um quadro na parede que na maioria do tempo deixei coberto para não atrapalhar o visor do meu computador. Subi no peitoral da janela e gritei: Eu venci!

Planei por alguns eternos segundos, finalmente me senti livre de toda a pressão, dor, mesmo do mundo. Planei mentalmente enquanto imaginava como seria a outra vida. Amanhã seria um novo dia; mas apenas para mim, os outros talvez nunca sentirão a liberade que agora vou experimentar, ah, os outros, estes nunca hão de sentir a liverdade enquanto petrificarem conceitos e definir o que é ser livre.

Eles dizem que são livres, será mesmo? Amigos, nem vocês são livres. Todos vocês, amigos e outros, acham que liberdade é ter poder dentro do sistema social, ou então acham que é se excluir do sistema social porque este encarcera. Há! Liberdade está no micro, não no macro... Enxerguem com seus olhos o que é sentir-se livres. Dou um fígado àqueles que me disserem que não se imaginam felizes sendo livres, para ser o que quiser, viver onde bem entender, plenamente. Essa palavra faz uma falta, não? Bem, descobri apenas agora, no último dia antes de eu completar 50 anos de vida que liberdade é sentir-se feliz com sua própria essência, e a prisão é estrangular a externações de sua essência para servir ao seu achismo superficial. Amigos, eu cansei disso, estou livre! Estou deixando essa carta para que não se preocupem, agora eu sou do mundo, o mundo do circo. Pois é, sou um palhaço profissionalmente agora, cansei de ser palhaço da vida.

Adeus, meus amigos, adeus. Amo cada um de vocês.

segunda-feira, 18 de maio de 2009

Parábola do Anjo

Certa vez um anjo subiu ao céu após ter ficado um dia na Terra. Voltou horrorizado, viu fome, dor, desespero, crueldade com seus irmãos. Antes achava o homem um forte, suportava o sofrimento sem preder a fé; agora achava que o homem era quem provocava seu sofrimento e que, portanto, suportar seu próprio sofrer era o mínimo que podia fazer e desgraçado fosse aquele que percorre a sua fé. Contou tudo isso a Miguel, este lhe respondeu "Volte lá e fique um mês".

O anjo voltou depois de um mês passado no Terra ao céu. A vida do homem era uma montanha-russa, ele provocavao seu sofrer apenas para sentir alegria com todo o seu sabor. O homem aprendeu a sofrer para saber como é ser feliz, e passa a vida inteira tendo grandes felicidades, achando que são pequenas, e esperando pela felicidade plena em que não há tédio. Miguel prestou atenção em todo raciocínio do anjo e disse: "você sempre esteve certo, anjo, o homem é tudo isso. Mas falta-lhe um terceiro foco, volta à Terra e fica mil anos".

No milênio seguinte voltou o Anjo e já foi logo ter com Miguel. "Não há verdadeiro sofrimento, há apenas o vazio, o tédio, a dor, mas eles não sofrem, é a realidade humana. O homem tem sua natureza para ser incompleto e passar toda a sua jornada tentando se preencher; alguns desenvolvem valores mais humanos, conhecem sua natureza e não a negam e reagem como podem. Estes são os mais interessantes, chegam ao mesmo resultado com raciocínios, valores, princípios e conclusões completamente diferentes. Eles creem que a dor ensina a superação; e a superação provoca sabedoria. Mal eles sabem que nada da jornada será retida ou aproveitada, eu pelo menos cria nisso, fiquei surpreso, Miguel, quando descobri que a sabedoria deles não era para ser retida e, sim, propagada, um último ato de generosidade que é aliviar a solidão e a dor de seus iguais".

No que Miguel respondeu: "Anjo, a alma humana é a vossa, e esses mil anos, um mês e um dia que passou entre eles na verdade era ao seu lado, vendo-se por um foco que não o subjetivo, calcado em valores e moralismo. Aprendeu mais sobre a alma que sobre o humano, mas não ache que aprendeu demais, cada indivíduo é único como o é acda face sua, e toda a sua verdade só serve para você".

sexta-feira, 15 de maio de 2009

Discurso do Estilhaço

Um estilhaço que te fez ser assim, tão percorrido em poucas linhas, que também escreveu "Vai, Carlos, ser gauché na vida", agora escreve: "Vai, Lucas, ser vida no gauché". Ainda bem que esses estilhaços não caem duas vezes no mesmo lugar, para quem o relógio disparou há muito tempo, que cada segundo voa por cima da cabeça puxando as horas a tiracolo já basta a primeira maldição, enxergar o mundo pelo próprio foco.

Compartilhá-lo? Talvez sim, talvez não. Aumentar a desgraça para aqueles que veem mas não conseguem distinguir não é digno de qualquer louvor, mas, sim, fazer a compreensão daqueles que também enxergam com sua própria visão se sentirem compreendidos e amados, isso sim é mérito.

A vida às vezes parece uma persona non grata, que quando não consegue mais nos derrubar cava faz-nos cavar nossa própria cova. Mas há quem ensine a ver o lado bom de cavar túneis, acha-se muitos diamantes que trazem a luz da superfície de volta aos olhos e o calor da alegria de volta ao coração. Assim que alguns justificam a caminhada para baixo e seguem felizes para a morte em vez de continuar vagando pela superfície de si mesmo e de repente cair na fossa que outra pessoa cavou. Felizes são esses alguns que encontram razão em morrer apenas porque só se morre vivendo.

O buraco que cavava um dia deu de encontrar minha toca, em que guardava minhas ferramentas. Rústicas por assim dizer, mas o que te espantou é que elas foram feitas com partes de mim mesma e para serem usadas a dois e não sozinha. E não me importava quem quisesse compartilhar de minhas coisas, o que me bastava era fazer algum sentido para aquela pessoa, dar um dos meus diamantes para que ele brilhasse na vida dela também. Talvez seja a luz que te ofuscou, talvez fosse a parceria proposta, ou talvez fosse alguém de personalidade misantropa com características altruísticas. Fosse qual fosse, havia seres que quanto mais machucassem seus corações mais inchados e maiores eles ficavam.

Os últimos humanistas não conseguiam mais acreditar na humanidade do indivíduo, mas os maiores existencialistas perderam a noção de humanidade. O indivíduo cresceu tanto que a humanidade virou um conjunto de indivíduos, e perdeu a própria personalidade. Ahasverus, o último humanista. Viu no que a humanidade se transformou, viu que os ideais viraram apenas ideias e que viver se transformou possuir para si.

Que de tanto espelhar-se na humanidade ninguém enxerga a si? Besteira... é o velho conto dos sábios que acharam o elefante uma corda por só conhecerem o rabo.
Mas é verdade que de tanto espelhar-se em si descobre-se a humanidade. E que isso tem a ver com o estilhaço? É o foco da visão que te une ao mundo, não o mundo que te une a visão. Vai, Lucas, ser vida nos túneis tortuosos da humanidade.

quinta-feira, 7 de maio de 2009

O menino-livro

Que de mero texto construído para saber da própria destruição.
Vagante do cemitério das línguas castigadas e esquecidas, sê tu o alazão da semântica.
Venhas a galope retrazendo o que nunca deveria ter sido levado.
A luz refrata no teu prisma, concentra-se num único ponto, o do teu coração.
E o teu coração bombeia fótons para aquecer todo o cosmo... univeros de si.
Letras que te fazem ser o que não tem, ter o que não é, mas o que deseja.
Teu mundo, teu mundo...